Dez voluntárias que exercem a função de doula comunitária têm contribuído para que o pré-parto, o parto e o pós-parto adquiram um caráter ainda mais humanizado na Maternidade Odete Valadares (MOV) e no Hospital Júlia Kubistchek (HJK), ambos da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Rede Fhemig).
Instituída oficialmente há oito anos na Rede Fhemig, inicialmente no Hospital Júlia Kubistchek e, cerca de dois anos após, na Maternidade Odete Valadares, a prática da incorporação do trabalho das doulas comunitárias, no contexto da assistência ao parto, representa um investimento objetivo para proporcionar melhores condições de saúde às gestantes e parturientes atendidas nas maternidades da Fundação.
As doulas comunitárias são mulheres que realizam trabalho voluntário de assistência às grávidas e parturientes no ambiente hospitalar. Elas atuam de modo a proporcionar conforto físico, emocional, espiritual e social às pacientes.
A aposentada Maria da Consolação Guerra Cassimiro (mais conhecida como Consola), de 58 anos de idade, é um bom exemplo da motivação que leva as mulheres a realizarem esta importante atividade. Depois de 39 anos de trabalho, nove dos quais na Maternidade Odete Valadares, a técnica em enfermagem, mãe e avó, decidiu tornar-se doula três anos após a aposentadoria. Hoje, ela já conta com dois anos de relevantes serviços prestados à causa da humanização do parto, tendo acompanhado mais de uma centena de mulheres antes, durante e após o nascimento de seus bebês.
“O que me motivou foi o amor pela vida. Como eu sempre trabalhei na obstetrícia, aproveitei a experiência e me dediquei ao trabalho de doula. Se você não ajuda os outros, a vida não tem sentido. É muito gratificante entrar na sala de pré-parto e ouvir as gestantes dizerem ‘olha o anjo aí’”, conta Consola.
Consola salienta ainda que a doula trabalha a autoestima das mulheres, fazendo com que se sintam protegidas. “Com o nosso apoio, elas têm à sua disposição alguém que está ali para apoiá-las”, pondera.
Os benefícios das ações promovidas pelas doulas consistem na diminuição da incidência de depressão pós-parto, redução da ansiedade, assim como a promoção da tranquilidade e do relaxamento.
Outro aspecto significativo é que a presença das doulas contribui, de forma efetiva, para a diminuição do uso de analgésicos e cesarianas como também, de forma indireta, ajuda a diminuir a taxa de infecção hospitalar, haja vista que os partos normais oferecem menor risco de infecção. Estes benefícios, entre outros, foram constatados em estudos qualitativos realizados por instituições de pesquisa nacionais e internacionais.
Uma das pioneiras do trabalho de doula na MOV, a aposentada Esther Cahen Kac, de 71 anos de idade, sempre foi atraída pelo contato com as pessoas, principalmente crianças. Há cinco anos, ela descobriu a atividade das doulas. “Eu lamentei não conhecer este trabalho antes. Ser doula é estar em contato com o princípio da vida. As pessoas devem se dar a oportunidade de conhecer este trabalho porque, muitas vezes, não se dão conta do papel da mãe. Eu sou uma entusiasta deste trabalho”, revela.
A também aposentada Célia Policarpo Xisto, de 68 anos de idade, é ainda mais enfática ao falar da função exercida pelas doulas. “É um trabalho que requer muito envolvimento. A pessoa tem que ter muita disposição para ajudar. No trabalho de parto, as mulheres ficam muito carentes. A doula é também uma confidente, uma amiga que dá carinho e atenção”, pontua.
Segundo a enfermeira e coordenadora das doulas da MOV, Adriane de Carvalho Oliveira, o papel destas mulheres é estar ao lado das pacientes, “elas falam a língua delas. Às vezes, nem precisa dizer muito com palavras, basta ouvi-las e segurar as suas mãos. Isto tem um efeito muito grande para o bem-estar das parturientes”, afirma.
Em razão da importância e dos benefícios da atuação das doulas, o ideal é que todos os plantões tenham pelo menos uma, o que significa uma cobertura de 24 horas. No entanto, isto ainda não é possível, haja vista que a demanda permanece maior que o número de voluntárias. Atualmente, são seis na MOV e quatro no HJK.
A operária Joyce Camila Soares, de 21 anos de idade, se prepara para ter seu primeiro filho. Em trabalho de parto, ela conta com a assistência da doula Consola. “Ela me deixa muito tranquila, faz massagens e conversa comigo”, diz.
Enfermeira e coordenadora das doulas do HJK, Luzia Maria da Silva Ventura, ressalta que as doulas estão preparadas para oferecer um cuidado diferenciado, “100% voltado para a mulher”, assegura.
De todo modo, é importante salientar que as atividades das doulas não se confundem com o trabalho técnico dos profissionais das equipes de obstetrícia que prestam assistência às parturientes, dado o caráter altamente especializado deste trabalho.
Portanto, a doula atua no contexto da humanização do parto, premissa preconizada pela Organização Mundial da Saúde e pelo Ministério da Saúde e posta em prática por um número crescente de instituições de saúde pública que compõem o Sistema Único de Saúde (SUS), principalmente após a lei federal nº 11.108, de abril de 2005, também conhecida como “Lei do Parto”, que garante às parturientes o direito à presença de acompanhante durante o trabalho de parto, parto e pós-parto imediato no âmbito do SUS.
Para atuarem, as doulas são treinadas em curso específico para a sua formação. Em Belo Horizonte, a divulgação do curso se dá através de cartazes afixados nos Centros de Saúde de todas as regionais da cidade, além de uma efetiva propaganda boca a boca.
As turmas são compostas por 20 a 30 participantes e são geridas pela Rede Cegonha, informa a apoiadora da Rede, a enfermeira Nelci Muller. Para se tornar doula comunitária, basta ser mulher, maior de 18 anos, pertencer à comunidade, ter disposição para cuidar das grávidas e parturientes, além de disponibilidade para atuar por 12 horas, uma vez por semana.
Lançada em março de 2011 pelo Ministério da Saúde, a estratégia da Rede Cegonha tem o objetivo de incentivar o parto normal humanizado. Desse modo, parte-se da premissa de que a gestante tem o direito de escolher a pessoa que irá acompanhá-la durante o parto. Assim, ela também pode optar por receber analgésicos, bem como decidir sobre a melhor posição para ter o bebê, além de ter contato com o recém-nascido, imediatamente, após o parto.
Em julho do ano passado, com o apoio do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), o Ministério da Saúde lançou o Guia dos Direitos da Gestante e do Bebê. Ilustrado pelo cartunista mineiro Ziraldo, a publicação traz informações sobre o direito à assistência ao recém-nascido e à mãe, assim como ao pré-natal de qualidade e ao parto humanizado.